jueves, 28 de junio de 2012

DINOSAURIOS crítica no I Festival Internacional de Artes Cênicas do Ceará

“O AMOR NUNCA MORRE”

Dinossauros, montagem do Grupo Cena, de Brasília, levado ao palco principal do TJA nesta quinta-feira nasce da convicção de seus criadores de que o teatro pode ser uma extraordinária máquina de maravilhas. E para isso não é preciso mais do que um refletor, uma sanfona e uma garrafa de bom vinho, desde que se tenha à mão um casal de atores com pleno domínio de sua técnica (Carmem Moretzsohn e Murilo Grossi), um diretor capaz de ouvir o silêncio (Guilherme Reis) e uma dramaturgia que faz dançar as palavras no grande salão das entrelinhas (Santiago Serrano). Da labuta sensível desses artistas e dos demais parceiros da viagem surge um poema cênico que encanta pela simplicidade e emociona pela generosa compreensão das vicissitudes humanas.

O espetáculo narra o encontro fortuito de um par de enjeitados, homem e mulher comuns, num banco de praça madrugada adentro. O que farão, o que dirão, o que terão a revelar de si um ao outro, senão o lamentável espetáculo de suas misérias? Como os dinossauros, animais inaptos e desproporcionais, vagueiam à procura de uma lógica para seus desenganos. São representantes falhados de um mundo extinto. Estão fora do lugar, perdidos num deserto onde as relações sensíveis cederam lugar ao pragmatismo dos resultados, a sinceridade passou a ser índice de tolice, e o outro deixou de ser fim para tornar-se meio.

Contudo, apesar de carregarem na testa a marca negra do fracasso, mantêm a improvável certeza de que tudo pode melhorar, afinal, como “o amor nunca morre” a felicidade pode estar vagando sob a débil luz de um poste perdido no meio da noite escura. Eis o mistério revelado: é preciso celebrar a vida! Relembrar as coisas boas do passado, descobrir no outro a diferença, comungar a estranheza do ato impensado, a pureza do gesto espontâneo, a coragem de reconhecer que a vida poderia ser outra, mas não foi. E rir, e dançar, e brincar como criança num sonho, antes que o dia amanheça como um cão raivoso, presas à mostra, a rosnar a mesquinha exigência de estar de acordo.

Dinossauros nos faz ter a certeza de que enquanto houver teatro, o que ainda temos de humano não será extinto.

Márcio Marciano

Dramaturgo e diretor teatral. Cursou Artes Cênicas na ECA/USP. Fundador da Companhia do Latão (SP), escreveu em parceria com Sérgio de Carvalho: "Ensaio Sobre o Latão", "O Nome do Sujeito", "A Comédia do Trabalho", "Auto dos Bons Tratos", "O Mercado do Gozo", "Equívocos Colecionados" e "Visões Siamesas". Além de experimentos cênicos como "A Ideologia Alemã" e "Valor de Troca", adaptado para a TV no projeto Direções, da TV Cultura. Em agosto de 2008, lançou pela Cosac Naify, "Companhia do Latão 7 Peças" com textos escritos ao longo dos últimos 10 anos na Companhia do Latão. Como crítico atuou na Revista Bravo!. Foi editor e hoje é colaborador da Revista Vintém (publicação da Companhia do Latão); é colaborador da Revista Moringa Teatro e Dança (do Departamento de Teatro da UFPB) e é editor da publicação Volante Lapada. Em 2007, atuou como crítico na II Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo, realizada pela Cooperativa Paulista de Teatro. Residente desde o início de 2006 em João Pessoa, criou na capital o Coletivo de Teatro Alfenim, para o qual escreveu e dirigiu "Quebra-Quilos" e "Milagre Brasileiro". Atuou como crítico do Zona de Transição, Festival Internacional de Teatro e Dança, promovido pelo Theatro José de Alencar, em Fortaleza (2009).


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